18 de julho de 2014

A luz entrava da janela distante

A luz entrava da janela distante, em forma de círculos coloridos que se dissipavam lentamente no ar, como se eles estivessem em uma dimensão diferente; eles tentavam eternizar aquele momento como se fosse uma foto com efeito psicodélico. Eles sabiam que aquele momento logo passaria, e que minutos passavam rápido demais. Sabiam que daqui a pouco ele teria que ir, e que daqui a pouco teriam se passado anos e anos... E que nem sempre a vida dura tanto quanto gostaríamos. 
Mas aquele momento, aquele tão pequeno e frágil momento, era deles e não existia nada além disso. Ele olhava a curvatura dos cílios dela, e ela tentava descobrir coisas no rosto dele que ninguém mais soubesse. Eles estavam deitados na cama do quarto todo branco, sem dizer nenhuma palavra, pensando em milhões de coisas diferentes. 
Enquanto os olhos acinzentados e cheios de pintinhas dela tentavam ler a alma dele, ele pensava que nem todo o tempo do mundo seria suficiente para estar com ela. Ele acariciava o rosto dela, bem na maçã do rosto, como se dissesse que a protegeria de qualquer coisa que viesse, e ela contava quantos riscos tinham os lábios dele. Talvez aquele fosse um dos momentos em que nem mesmo fazer amor consegue expressar o quanto são felizes por terem um ao outro; então ficam lá em silêncio, parados, apenas se olhando e tentando fazer durar... 
Ele era o amuleto dela, a sua força, por quem ela lutaria e pra quem ela voltaria ao final de cada voo, e ela era a sua pequena, aquela que ele esperava voltar, de quem ele cuidaria, e a quem ele dedicaria todo amor que pudesse sentir. Ela era sua borboleta, e ele era o jardim dela. 
Não importava quantos séculos se passassem, ou quantos quilômetros estivessem entre eles, o amor dos dois era palpável, mais real até do que eles mesmos, mais material do que seus corpos, mais profundo que um abismo. Mesmo quando ele fosse embora, e eles não pudessem mais se tocar fisicamente, ainda assim o amor deles seria tocável, e ainda assim eles estariam juntos de uma maneira que é impossível explicar.
Ela beijou suavemente os lábios dele, tentando transferir todo o amor e carinho do coração dela para o dele, e ele sentiu. De alguma forma ele sentiu. Quando eles estavam juntos, aconteciam coisas fisicamente impossíveis, exatamente como a mágica em que a gente acredita quando é criança. Quando eles estavam juntos, coisas lindas subitamente aconteciam: estrelas caíam do céu, a luz desmanchava-se em colorido, apareciam círculos de luz furta-cor no ar, dançando e rodopiando, fogos explodiam no céu escuro. E quando eles estavam longe, todo o universo conspirava para que eles se aproximassem. 
Naquele momento em que ela descansava a cabeça no peito dele, sentindo o coração dele bater sereno e ritmado, e ele organizava alguns fios do cabelo dela que estavam fora do lugar, tudo estava certo. Não existiam problemas , não existia errado. O mundo era deles e eles viveriam aquela história da maneira como quisessem.
Infelizmente nas melhores histórias de amor o relógio badala, e, repentinamente, chegou a hora dele ir. Ele se levantou e foi até a porta, e ela foi atrás, o vestido branco dançando junto com o corpo. Ele se virou para dizer adeus, olhou fundo nos olhos dela e prometeu que voltaria. Ela o beijou desesperadamente, sabendo que aquele não seria o último beijo, apesar de ser, temporariamente. Seu cabelo fazia cosquinha no pescoço dele, e ela apertava sua nuca com a ânsia de quem vai saltar de um lugar alto. E ficaram ali, se beijando eternamente, até se separarem ao mesmo tempo e ele andar para longe com os cabelos desgrenhados e um sorriso gigante no rosto. Os pés dela deslizaram pelo chão claro, as pedrinhas da sua tornozeleira brilhando na luz tênue que entrava pela janela distante. Seus pés foram pisando cada vez mais de leve, até não tocarem mais o chão, e ela voou. 
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