18 de julho de 2015

Depois da meia-noite

Aquela era uma noite particularmente escura e úmida, e ele andava pelas ruas da cidade como se estivesse sendo perseguido. Parecia entristecido, mas, mais que tudo, parecia muito solitário.
Seus cabelos caíam sobre o rosto, escondendo os olhos, em parte porque ele andava olhando para os pés. 
Vestia moletom azulado, e uma camiseta com estampa engraçada. Calçava um par de tênis como outro qualquer. 
Em dado momento, começou a olhar repetidamente para o céu, procurando uma estrela, quem sabe. Eram mais de meia-noite.
Ele se sentia tolo, estúpido, assustado, frustrado, iludido. Ele estava desesperado e desorientado. Se sentia um lixo. Ele tinha que dormir, na verdade; era o melhor a se fazer. 
E é por isso que correu de volta para casa, onde quer que ela fosse. Por mais que se sentisse perdido, conseguia se deixar guiar. Pelas estrelas, quem sabe. 
Estava ofegante quando chegou. Mas sobretudo estava cansado. Gotas de suor escorriam por sua testa. 
Quando abriu a porta do quarto, notou que sua cama estava feita. E mais arrumada do que algum dia já estivera. Ela brilhava, como se alguém houvesse jogado purpurina.  
Não percebera que o chuveiro estava ligado até ouvir as gotas pararem de cair. Uma moça enrolada na toalha saiu pela porta do banheiro, com os cabelos dourados pingando. 
- Você chegou! 
Ela correu em direção a ele, pulou no seu colo e o beijou como ninguém nunca o havia beijado antes. Seus braços envolveram o pescoço dele, os cabelos molhados se emaranharam, e no meio daquela mistura de corpos, a toalha escorregou para o chão. 
A mistura de corpos de igual forma escorregou para cima do lençol, e pedaços de estrelas grudaram em seu suor. A purpurina voou, formando uma nuvem em volta deles, enchendo o quarto, a casa, seus pulmões. Purpurina caía do teto e escorria pelas paredes, os inundando, porque aquela garota era capaz de fazer mágica. Ela lhe oferecia algo que ninguém pudera até então: amor. Um amor que ele não tinha que merecer. E que ele não merecia, de fato.
Ele deveria temer que tudo aquilo acabasse, o momento, a magia, mas ao invés disso, mergulhou na luz que emanava dela. Deixou que o corpo úmido dela lavasse sua alma, e levasse embora o medo. E permaneceu em silêncio, por precaução, deixando-se esmagar pelas milhares de estrelas que caíam do céu. 
Ele acorda na manhã seguinte, sozinho em seus lençóis sujos, como costumava ser. Sente frio, pois ainda usa as mesmas roupas molhadas e com cheiro de mofo que usava na noite anterior. Até os tênis está calçando ainda.
Começa a chorar, derrotado, porque tudo não passou de um sonho. Jamais voltaria a vê-la. Mais do que nunca percebe o quanto vive uma vida cheia de adjetivos ruins. E enquanto repensa sua existência escuta um barulho na sala. Ela ainda está aqui. 
Corre para lá no mesmo instante, e, parado bem no meio da sala mais feia do mundo, está um cavalo branco encardido, parcialmente manchado de purpurina, com um chifre torcido saindo do meio dos olhos. 
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